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A história do homem invisível (Ônibus 174)
Imagine que você nasceu em uma favela do Rio de Janeiro e aos 6 anos de idade, você vê sua mãe, grávida de 5 meses, sendo degolada e esfaqueada na sua frente. Dentro da barriga dela, dá pra ver ainda alguma coisa se mexendo freneticamente, como se fosse algo perdendo o ar, desesperadamente tentando sair, morrendo de asfixia. Você não tem mais família, não sabe quem é seu pai, vai morar na rua. Vive de cola, por que viver de respeito é coisa pra gente rica. Ninguém te dá dinheiro, ninguém te dá atenção. E você ainda não consegue tirar da cabeça a imagem da sua mãe morta. Você vai junto com outras crianças se refugiar nas calçadas da igreja da Candelária. Já tem 15 anos, é viciado em cola e em coca. Rouba pra isso. Uma noite, quando todos estão dormindo, você ouve tiros e sai correndo. Você acaba de escapar da chacina da Candelária, de 1993. Depois disso, sua vida é só crime, droga e prisão, sem a mínima chance nem estímulo de regeneração, a não ser pela sua fé em Deus que nem você mesmo explica. De repente, aos 26 anos de idade você entra dentro de um ônibus no Jardim Botânico sentido Centro e se vê em uma situação que sempre sonhou: o Brasil inteiro sabe seu nome, sabe de sua história, toda a rede televisiva do país está com dezenas de câmeras apontadas só para você. Esta é a sua chance de deixar de ser invisível, deixar de ser calado por um cacetete. Você se vê com o poder que nunca teve, de falar e de ser respeitado, pois disso depende a vida da refém que está na sua frente, com uma arma contra a testa dela que você está apontando. Você não tem absolutamente nada a perder.
Agora imagine que você é um comandante policial carioca. Você achava que ser policial era só saber atirar ter coragem pra entrar em favela e matar traficante. Você está do lado de fora de um ônibus tomado por um homem, que você não sabe quem é e nem quantas pessoas ele tem como refém. Jornalistas e civis estão por toda parte, o Brasil inteiro está esperando uma atitude sua. Atirar no cara é fácil, mas estourar a cabeça dele na frente de milhões de pessoas pode não ser muito agradável. Seu superior, por telefone, lhe deu ordens de não atirar em ninguém. Uma das reféns escreve no vidro dianteiro do ônibus “Ele vai matar geral às 6 hs.” Você tem menos de duas horas e meia para salvar as pessoas que estão no ônibus, e não faz a mínima idéia de como fazer isso.
Tudo isso está no documentário sobre o seqüestro do ônibus 174, que está em cartaz no Cine Art Lílian Lemmertz, do lado do Sesc Pompéia, com única sessão às 21 hs.
Acredite: você nunca mais vai entrar em um ônibus como antes.
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